27.03.2012
Ser revistado pela polícia durante um passeio ou na volta para casa é situação rotineira para os estudantes da Faculdade Zumbi dos Palmares. A instituição paulistana é especializada na inclusão de afrodescendentes no ensino superior: 90% dos alunos matriculados são negros e (não) acham graça quando questionados sobre as batidas policiais. “Você está se referindo ao número de vezes só hoje, não é?”, brincam. Eles têm de conviver com o preconceito que ainda persiste na sociedade brasileira, apesar de o País ter abolido a escravidão há mais de 120 anos.
Mas o racismo não se limita às investidas dos oficiais. Ele está
comprovado nos índices de pobreza, nas taxas de escolaridade, de
analfabetismo e de longevidade. Na última década, muitos avanços no
combate à desigualdade racial ocorreram no Brasil. Entretanto, eles
ainda não são suficientes para superar os boicotes enfrentados pelos
negros na História do Brasil. É o que afirma Ricardo Paes de Barros,
subsecretário de Ações Estratégicas da Secretaria de Assuntos
Estratégicos da Presidência da República.
Segundo ele, a população negra foi a grande protagonista da ascensão
da nova classe média brasileira. Uma pesquisa realizada pelo Data
Popular em dezembro do ano passado apontou um aumento de negros na
classe C – de 34%, em 2004, para 45% em 2009. Eles movimentam 673
bilhões de reais por ano, mas ainda não têm pleno acesso a oportunidades
do topo da distribuição de renda. “Um exemplo disso é a venda de
celulares. Hoje em dia o número de aparelhos vendidos para os negros é
equivalente à média brasileira, mas o acesso à internet ainda é um
privilégio dos brancos”, declara.
Para o subsecretário, as estatísticas mostram que o Brasil criou um
colchão, uma base para melhorar a qualidade de vida dos negros, mas as
políticas públicas na outra ponta da pirâmide social foram deixadas de
lado. “Atualmente a pobreza é bicolor, mas os principais cargos e
empregos ainda pertencem à população branca.”
Ele exemplifica dizendo que os negros são apenas 20% do total de
pessoas que ganham mais de dez salários mínimos. Esta mesma porcentagem
representa a população negra no total de brasileiros que fazem
pós-graduação. “Portanto, nesses postos mais desejados, a diferença
entre brancos e negros foi preservada no sentido de desigualdade.
Falhamos em identificar os talentos negros do Brasil”, conclui.
A saída para reverter esse quadro, segundo ele, é a adoção de medidas
afirmativas para o topo dos bens e serviços. “Nós temos que incentivar
as políticas meritocraticamente, arejando as classes altas com pessoas
que merecem ocupar os bons cargos. Adotar uma política de
‘caça-talentos’ desde cedo, nas escolas e em outras instituições de
ensino”, reflete.
Mário Lisboa Theodoro, secretário executivo da Secretaria Especial de
Promoção da Igualdade Racial, adianta que o governo federal já está
trabalhando nesse sentido. Ele diz que em abril deve ser lançado o
Programa Nacional de Ações Afirmativas. A medida será o cumprimento do
Estatuto de Igualdade Social e vai englobar três grandes áreas:
trabalho, educação e de comunicação/cultura. “Estamos montando esse
programa, ele será pactuado com oito ministérios e deve ser levado à
presidenta da República até o início de abril”.
Observatório da População Negra
As secretarias de Assuntos Estratégicos da Presidência da República e
a Especial de Promoção da Igualdade Racial, em parceria com a Faculdade
Zumbi dos Palmares, lançaram na quarta-feira 21 o Observatório da
População Negra, primeiro banco de dados nacional sobre os
afrodescendentes no Brasil.
O Observatório vai reunir informações sobre mercado de trabalho,
distribuição de renda, demografia, habitação, estrutura familiar e
educação. “É o maior banco de dados sobre negros no Brasil. Hoje ele se
inicia com 50 mil informações, dos últimos 20 anos, e com perspectivas
socioeconômicas que abrangem habitação, políticas públicas e mercado de
trabalho, entre outros”, explicou José Vicente, reitor da Zumbi dos
Palmares.
Eliane Barbosa da Conceição, professora da faculdade e uma das
pesquisadoras do Observatório, diz que a intenção é revelar valores que
explicitem as desigualdades, indicando quais as melhores políticas a
serem adotadas em cada região do País.
O Observatório pode ser acessado no link www.observatoriodonegro.org.br
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